Os que vem de lá

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radio antigo azul

Brasileiros bonzinhos que somos, deixamos outros povos roerem nossos restos. E nos vangloriamos disso.


OS QUE VEM DE LÁ.

Estou aguardando para pagar as compras no caixa do mercado. Três funcionárias conversam ali ao lado. Não consigo reconhecer o sotaque da falante do grupo. Mas ela explica ser do Sergipe. As colegas, uma do sul da Bahia, outra do Ceará. O senhor do caixa ao lado, posso identificar como Venezuelano, pelo portunhol que ele vai arrastando entre um sorriso farto.

Então é isso, nessa terra onde todos somos de algum outro lugar, ou somos descendentes de pessoas que vieram para cá, agora temos uma nova leva de imigrantes de vários países e de brasileiros de outros estados que baixaram por aqui.

Além dos estados do sul e do nordeste, recebemos os haitianos, os venezuelanos, nigerianos, bengaleses, que generalizamos como indianos e outros mais.

É bom destacar, que embora estejamos submetendo essas pessoas aos nossos arcaicos processos de discriminação, pelo menos não estamos vendo este movimento como uma invasão. Ou seja, como algo que nos coloque em risco. Não que isso sirva de consolo. Pois acolhedores é que não estamos sendo.

Mas deste fato origina-se um perigo. Se segregamos estes recém-chegados a uma situação de acessarem apenas os empregos que não queremos, vamos acabar criando uma nova classe de pessoas que vou ousar chamar de “cidadãos de segunda categoria”. Essa minha classificação está cheia de problemas. Afinal eu mesmo já me considero um cidadão de segunda ou de terceira categoria, por não dispor dos privilégios que outros brasileiros têm. Assim como aposentadoria integral, acesso a um serviço de saúde diferente do SUS e muitos outros direitos que algumas categorias têm e eu não tenho. Então, eles são mais brasileiros do que eu?

Mas pulando isso, quero explicar porque da dificuldade destes migrantes.

Se vamos dedicar a eles os empregos que não queremos, as piores moradias, escolas e serviços de saúde sem qualquer preparo para acolhê-los nas suas diferenças, e por aí vai, não poderemos cobrar deles uma porção de coisas.

Solução? O que precisamos, enquanto Estado e enquanto sociedade, é dar a todos as mesmas oportunidades.

Parou tudo, não é? Este País não disponibiliza as mesmas oportunidades nem para os nascidos aqui, nem para os pobres, nem para a classe média. Imagine para os que vêm de lá, de outras terras.

Com isso aprofundamos as diferenças, intensificamos a violência e não saímos do lugar. A não ser por nos sentirmos brasileiros bonzinhos por permitir que outros acessem nossos restos.

Essa história é antiga, muito velha, mas bem de hoje.

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Áudio: Trabalhos técnicos de Ricardo Lima – Rádio UEL.

Acesse AQUI outro post da Coluna O COTIDIANO.

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